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Pai de Santa Isabel constrói máquina para filho de 16 anos aprender a caminhar

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O forte do ambulante José Dimas da Silva pode até não ser a mecânica nem muito menos a medicina. Mas por amor, Silva, antes leigo, se transforma em um expert nestas áreas. No começo de agosto, ele e um amigo finalizaram uma máquina que pode ensinar o filho, Hugo Aparecido da Silva, de 16 anos a andar. Pelo menos é o que esse pai espera. “É por amor que faço tudo isso. Graças a Deus meu filho está aqui. Para mim essa deficiência é apenas um detalhe. Meu grande sonho é ver meu filho andar ou dar nem que seja uma passada. E até isso acontecer serei incansável”, diz Dimas.

Apesar dos seus 55 anos, Dimas trabalha 15 horas por dia vendendo tapioca na região central de Santa Isabel (SP) e mesmo assim ainda encontra pique para pesquisar, estudar e cuidar do filho. “Ele não reclama e a gente que não tem nada vai ficar reclamando? Eu ainda tenho um problema na visão, sou quase cego, e nada disso isso me impediu de trabalhar. O que quero é mostrar aos meus filhos que se você tiver vontade nada atrapalha”. Além de Hugo, o ambulante também é pai de Sérgio Tadeu da Silva, de 22 anos.

A deficiência do caçula Hugo foi notada pela família aos 11 meses. Segundo o pai, as pernas do filho perderam o movimento inesperadamente e endureceram. “Ele não sentia nada. Passamos em vários médicos na região e ninguém sabia dizer de fato o que ele tinha. Até que, aos 6 anos, o levamos para a Associação de Assistência à Criança Deficiente (AACD), em São Paulo. Lá disseram que ele tinha uma paraparesia espástica, uma espécie de paralisia cerebral que afeta a parte motora”, conta o pai. “Ficamos chocados quando tudo aconteceu porque não esperávamos. Procuramos nos acostumar com a ideia e correr atrás do prejuízo. Até hoje cuido dele e não vejo muitas dificuldades. Ele se vira bem e é muito fácil ser pai do Hugo”, reforça Dimas.

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Antes de ir para a AACD, Hugo não usava cadeira de rodas. Ao todo já foram duas cirurgias. Após a primeira o estudante começou a usar muletas, o que deu mais independência a ele.
A mais recente intervenção médica foi no final de julho. Por conta dela, atualmente Hugo está com as duas pernas engessadas. “Com essa cirurgia posso conseguir ficar em pé sozinho. Se tivesse me esforçado mais eu não teria que ter feito. Agora dou mais valor à vida. Ficar na cama é ruim”, admite o estudante.

Ao falar da dedicação do pai, Hugo se cala por alguns instantes. A braveza do pai de 55 anos, já aposentado por invalidez e que mesmo assim trabalha há 14 anos vendendo tapioca na cidade, o emociona. “Meu pai sempre fez tudo pra mim. Ele é um incansável. Quando falo que ele precisa de férias, ele responde que não pode porque tem que cuidar de mim. Isso me deixa muito feliz. É gratificante ouvir isso de um pai e com certeza penso em retribuir. Vou me esforçar mais para vê-lo feliz, pois o maior sonho dele é me ver andando”, revela Hugo.

Máquina dos sonhos

A ideia do simulador de caminhada criado por Dimas, em Santa Isabel, nasceu há cerca de um ano. A máquina seria um cérebro mecânico que forçaria o filho a caminhar. “Já que o cérebro do Hugo não manda estímulos para as pernas, vamos fazer isso com a ajuda de um motor. Em junho, antes da cirurgia, fizemos um teste com o simulador pré- pronto, apenas motorizado, e todo o quadril dele se mexeu. É isso que queremos, que ele exercite as pernas e aprenda a andar com a máquina”, explica o pai.

Pai constroi máquina para filho aprender a andar

A vontade de fazer a máquina para o filho veio após Dimas encontrar na internet um simulador feito na Argentina. “Vi que na Argentina um pai construiu esse simulador para o filho voltar a andar. O menino com 10 minutos de máquina já deu uma passada. O pai era mecânico e foi mais fácil. Até tentei comprar esse simulador argentino, mas vi que o mais barato custava US$ 30 mil. Algo impossível para mim”, conta.

Mesmo não sendo mecânico, como o pai argentino, Dimas não desistiu. Apesar de não ter as habilidades práticas para construir uma máquina, o pai de Santa Isabel tinha o mesmo combustível que o da Argentina: o desejo de ver o filho caminhando. “Quando a gente tem vontade a gente consegue. Então pesquisei e como não tinha um projeto para fazer essa máquina comprei em uma loja um ‘simulador aeróbico’ para servir como base. Ele tem a mesma finalidade de exercitar os músculos, mas é manual. Por isso comprei o motor e algumas peças para a adaptação”, lembra.

Ao todo foram dois meses de trabalho. Só Dimas, com a base e o motor, chegou a gastar cerca de R$ 2,5 mil. Em seguida ele foi atrás de quem pudesse ajudá-lo com a parte mecânica. “Fui até uma fábrica de robô industrial da cidade para pedir ajuda e eles disseram que iriam fazer, mas ficaram um ano com a base parada. Então fui até lá revoltado e falei ‘o senhor não fez porque não tem um filho com deficiência em casa. O senhor não sabe o quanto dói!”, se recorda. Foi nesse momento que o ambulante encontrou o apoio do amigo Ricardo Bela Vista. “Em maio entreguei as peças para o Ricardo e em dois meses, aos poucos, ele e outros amigos terminaram”, diz o pai.

Todo o restante da adaptação, como cintos de alpinista, parte elétrica, de velocidade, corrente, foi exclusivamente bancado pelos amigos de Dimas. “Essa seria a parte mais cara do simulador e eles não me cobraram nada para fazer. Agradeço muito a cada um deles.”

A ideia é que a máquina caminhe pelo filho de Dimas, exercitando e dando força para os membros do estudante. Seria como se o aparelho fosse ensinar Hugo a andar. Para isso um guincho foi instalado para levantar e descer Hugo. Os pés dele ainda deverão ficar presos.

De acordo com o pai, a velocidade máxima do simulador é de 60 km/h. “O equipamento pronto deve valer cerca de uns R$ 5 mil. Acho que o resultado vai ser 100%, por isso acreditei e apostei. Esse dinheiro não vai fazer falta, pois tenho fé que ele vai melhorar” afirma o ambulante. “Meu filho nunca andou e justamente por isso os médicos não dizem se ele pode ou não andar um dia. Mas tudo depende de esforço. Ver meu filho caminhando vai ser bom demais. Muita felicidade. Nem que seja apenas umas passadas, que ele nunca deu. Eu acredito”, conta com determinação o pai.

E se a firmeza do pai contagia a todos, não poderia ser diferente com o filho. Hugo não só reconhece o empenho como também tenta seguir os passos do pai. “Quando ele disse que ia fazer a máquina foi algo marcante e importante para mim. Ele gastou dinheiro, deu opinião, correu atrás de tudo. Que pai faria isso para o filho?”, se questiona Hugo.

“Ele é o melhor pai do mundo! É meu ídolo e faz tudo para me ajudar. Ele sempre diz ‘ vamos pelo menos tentar’, e ele sempre tenta. Isso é importante para mim. Eu poderia ter uma família que não se preocupasse comigo, mas todos me ajudam e isso é decisivo na minha recuperação. Confesso que sinceramente já pensei em desistir, mas depois lembro que meu pai faz tudo por mim e ai procuro tentar. Se vai ou não dar certo não sei mas vou, ou melhor, vamos tentar. Acho que se eu me dedicar posso melhorar mais”, diz Hugo.

O equipamento de caminhada recebeu provisoriamente o nome de ‘Hugo’. “O simulador não serve só para o Hugo, se ele vier a dar resultado para ele quero ajudar outras crianças. Colocar a máquina em outro lugar. Por isso ela vai levar o nome do meu filho”, revela.

Agora a expectativa é para que o estudante inaugure o simulador. Mas antes disso é preciso que os fisioterapeutas aprovem. “Acho que não corre o risco de os médicos não aprovarem porque a base foi um aparelho de exercícios que já existia. No próximo dia 14 vou levar a foto do aparelho para os médicos da AACD analisarem. Meu filho precisa andar para amolecer as pernas e o quadril. Com o aparelho seria como se meu filho fosse ‘andar parado’ e o que fizemos só foi adaptar para prendê-lo no aparelho. O motor será o estímulo, que na forma natural, veio com uma falha em meu filho”, explica.

Locomoção mais moderna

Há quatro anos para se locomover pela cidade, no lugar da cadeira de rodas o estudante utiliza algo mais sofisticado: um quadriciclo. É em quatro e não mais em duas rodas que Hugo vai para a escola, para o mercado com os pai, para o hospital, enfim, para qualquer lugar de Santa Isabel.

Porém, o veículo automotor não veio por luxo e sim necessidade. “A cadeira de rodas era usada para longas distâncias, mas com o tempo usá-la na cidade ficou cada vez mais difícil. As ruas, calçadas e o município em si não são preparados para os cadeirantes. Chegamos a pensar em uma cadeira elétrica, mas íamos sofrer com o mesmo problema por conta das rodas. Então um amigo do meu pai deu a ideia do quadriciclo, que serve para trilhas, e assim teria mais estrutura para andar pela cidade”, conta Hugo.

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Desde de 2009, então, Hugo é visto por Santa Isabel com seu quadriciclo adaptado. Um investimento de mais de R$ 4,5 mil. Fruto de muitas tapiocas vendidas no Centro. “Minhas condições melhoraram um pouco e consegui comprar. Depois adaptamos como se fosse um veículo: tem motor com marcha, como de moto, e seta, por exemplo. Fiz isso para os outros carros terem mais visão e aumentar a segurança do Hugo. Fora isso também para realizar o sonho do meu filho de dirigir um carro. Se deixar ele fica nele o dia todo”, diz contente o pai.

Para poder andar com o quadrciclo na cidade, a família ainda colocou um adesivo de deficiente físico e pediu autorização para as polícias Militar e Rodoviária. A única ordem é não abusar da velocidade, já que Hugo é o único piloto do automotor. “Sempre sou eu quem piloto. Meus pais não me deixam sair sozinho, sempre estão na garupa comigo. Eles e minhas muletas. A troca da cadeira pelo quadriciclo foi maravilhosa. A cadeira me dava dor nas costas e com o quadriciclo tenho a sensação de liberdade. Me sinto mais independente”, diz o estudante.

Para Dimas ser pai de Hugo é uma missão altamente prazerosa. “É bom ser pai do Hugo. Ele é gente boa. Levo-o para cima e para baixo e a gente se diverte, apesar das dificuldades de acessibilidade que temos que enfrentar tanto em São Paulo como em Santa Isabel.”

Já para Hugo, ser filho de Dimas não tem explicação. “Tudo o que eu preciso ele faz. Um exemplo foi quando ele subiu, por nove meses, 22 degraus comigo no colo. Olha que são 43 quilos! Ele fez isso só para eu fazer o curso de informática. Faltando dois meses para eu concluir decidimos parar, pois estava difícil para meu pai. Era cansativo e ele já trabalha a semana toda. O que ele faz não tem explicação. Ele é meu ídolo”.

 

G1

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