RJ: pais de deficientes lutam na Justiça por remédios de uso contínuo
Eles exigem fornecimento da prefeitura e do estado. Em alguns casos, remédios negados custam menos de R$10. Em 2015, o Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência prestou auxílio jurídico em mais de 500 ações.
A dona de casa Shayenne Carine tem seis filhos, entre eles Brenda, de 11 anos, que tem microcefalia. Mãe solteira, declaradamente em condição de carência, ela trabalha fazendo bicos e recebe recursos do Bolsa Família e do Benefício de Prestação Continuada para poder criar os filhos. Em tempos de crise e inflação em alta, Shayenne sabe o quanto pesa tirar dinheiro do bolso para comprar um remédio para a filha que deveria ser entregue gratuitamente. Mas todo mês ela tem feito isso, mesmo após uma ação judicial que moveu obrigando a prefeitura do Rio a fornecer o medicamento Neuleptil, cujo valor não passa dos R$ 8. A ação envolvendo Shayenne e Brenda é só uma das mais de 500 que tiveram auxílio jurídico do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência, o IBDD. Segundo o instituto, só no último mês, seis sentenças favoráveis à liberação de medicamentos não foram cumpridas. Enquanto isso, a falta do calmante, de uso diário, já causa efeitos na saúde de Brenda, como conta a mãe Shayenne.
‘Ela fica nervosa, inquieta, quebra tudo. Derruba tudo do fogão, ataca tudo, morde, bate, puxa cabelo, se morde… Ela pega os irmãos, que são menores e não entendem.’
O drama de Shayenne e Brenda não é isolado. Sônia Brito é mãe de Célio Francisco, que tem paralisia cerebral. Em setembro de 2014 ela entrou com uma ação pedindo às secretarias municipal e estadual de Saúde o fornecimento do Diazepan, um medicamento de uso controlado. Em dezembro de 2014 a Justiça deu ganho de causa para ela, mas até hoje Sônia não recebeu nenhuma caixa do remédio. Agora, foi pedido o bloqueio do dinheiro na conta da prefeitura para que a compra seja feita. Nas farmácias, a medicação tem custo médio de R$ 5. Sônia explica que já entregou laudos e orçamentos mais de uma vez para tentar garantir o fornecimento do produto.
‘O juiz pediu para a gente fazer orçamentos do medicamento. Fiz isso algumas vezes, umas três vezes. Mandei tudo certinho com laudos médicos, atestando que ele precisava usar medicamentos. Foi tudo super certinho. Do jeito que eles pediram, eu fiz.’
Na opinião da superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência, Teresa d’Amaral, os dois casos revelam negligência por parte do poder público no atendimento dado às pessoas com deficiência.
‘É de um descaso total com a questão da pessoa com deficiência. A gente vê, por exemplo, mediacmentos de uso continuado cardiológico, ou outros como o de HIV, todos esses continuam sendo fornecidos e são remédios caros. Não quero que tire, de jeito nenhum, mas estou dizendo que é falta de respeito. Uma questão tão simples.’
Em nota, a Secretaria municipal de Saúde disse que o processo de compra para o medicamento Neuleptil, de Brenda, foi concluído. Porém, o fornecedor não cumpriu o prazo de entrega. Ele foi advertido e, agora, a nova data está prevista para a próxima sexta-feira, dia 29. Já sobre o medicamento do paciente Celio Francisco, o Diazepan, a Secretaria informou que ele está disponível no momento e que não precisa de agendamento para a retirada. Ainda assim, para atender à determinação judicial, após o nosso contato, a Secretaria disse que vai procurar a mãe do paciente para dizer que o remédio está disponível. Sobre o caso de Francisco, a Secretaria estadual não se manifestou.
Mas a CBN questionou as duas secretarias quanto a outros medicamentos, destinados a mais quatro pacientes. A Secretaria do município disse que foi notificada da necessidade de comprar o medicamento Ursacol para um paciente durante o recesso de fim de ano. Na início do ano, o processo de compra foi aberto. A Secretaria de Estado, sobre o mesmo caso, disse que tem o remédio, bastando o comparecimento para fazer retirada do medicamento. Essa mesma pessoa precisa fazer uso do Mezacol, também disponível neste momento pelo estado.
Em outro caso, a Secretaria do município diz que iniciou a compra dos remédios Trileptal e Nistatina + Óxido de Zinco. Este último, no entanto, está disponível na farmácia do estado.
Por fim, sobre um último medicamento, o Dicloridrato de Sapropterina, a Secretaria de Estado diz que abriu licitação, mas não apareceram fornecedores interessados. A Secretaria disse que tomará as devidas providências para regularizar o estoque. Já o município diz que há seis meses fez a entrega deste remédio e que o paciente tem que entregar nova receita para que um novo processo de compra seja realizado.
Fonte: cbn.globoradio.globo.com