O líder que inspira pelo exemplo: Srna presenteia fã com síndrome de Down
Um líder nato se destaca em meio ao grupo. Pode impor respeito por diversos métodos, mas geralmente conquista seu posto sem ser questionado quando sua conduta serve de exemplo aos demais. Darijo Srna, na teoria, pode não parecer o dono de um perfil para ser capitão em campo. Emotivo demais, intenso demais, mais coração do que razão. A lógica, porém, se rende a um adjetivo que carrega a essência da idolatria. Por sua história dentro e, principalmente, fora dos gramados, o croata alcançou um status raro no esporte e na vida: ser inspirador.
Neste sábado, Srna interrompeu a correria da preparação croata para o jogo de abertura da Copa, contra o Brasil, simplesmente para inspirar. Ainda suado após o treinamento, parou por dois minutos para conhecer João Ulisses Bahia – que, assim com o irmão do atleta, tem síndrome de Down.
Filho de um órfão da Segundo Guerra Mundial e muito humilde na infância, Srna se apegou à família como base para correr atrás de seus sonhos. Sempre foi muito emotivo – e chegou a ser criticado nos gramados justamente pela intensidade desmedida de seus sentimentos. Nunca teve vergonha de expô-los e cansou de chorar em público nas derrotas. Em todos os momentos, bons ou ruins, sempre fez questão de mostrar o orgulho que sente do irmão Igor. Tanto que tatuou o nome dele no lado esquerdo do peito e o homenageia com frequência quando calha de balançar as redes.
A devoção ao irmão tornou Srna uma pessoa mais paciente, mais preocupada com os outros. Passou a ajudar instituições e comandar ações avulsas para alegrar àqueles que nem conhece. Repetidas vezes bancou pequenas fortunas para que órfãos pudessem ir a um estádio de futebol e ter um dia de diversão.
Neste sábado, foi a vez de esbanjar simpatia, se arriscar no português e levar um sorriso a João. Com 32 anos, mesma idade do jogador, o baiano frequenta a unidade profissionalizante da Apae (Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais) de Salvador. No rápido encontro, João ficou tão emocionado que perdeu as palavras que havia ensaiado enquanto assistia ao treinamento croata. Ganhou de Srna uma mini bola autografada para levar para casa e recebeu uma camisa oficial com a assinatura de todos os atletas para ser leiloada e arrecadar verba para a instituição.
– Eu tenho essa relação especial com quem tem síndrome de Down por causa do meu irmão.
Algumas pessoas veem como um problema, mas eu não. Eu espero que mais pessoas se mobilizem e ajudem doando dinheiro para associações que ajudam crianças e outras pessoas a se desenvolverem e terem uma vida normal. Temos que dar apoio e ajudá-las a serem felizes. Elas devem ser felizes. E jogadores podem fazer isso de uma forma muito simples. Basta ir a um hospital ou a uma escola para dar este pouquinho de alegria.
Apesar de saber a escalação inteira do Bahia, seu time de coração, João seguiu outros caminhos na prática de esportes. Jogou handebol e fez natação por anos no antigo centro aquático da Fonte Nova, colecionando títulos nas Olimpíadas das Apaes do Brasil, entre outras competições.
Durante a Copa, porém, ele garante que vai ficar ligado no futebol. Além de Srna, sabe que a Croácia conta com dois atletas nascidos no Brasil no elenco – os naturalizados Eduardo da Silva e Sammir. Mas nem a experiência deste fim de semana fez o rapaz virar a casaca.
– Desejo muito boa sorte para eles, mas na Copa vai dar Brasil. A taça é nossa.
Fonte: G1