A necessidade de lidar com o dinheiro no dia a dia é um dos principais desafios dos cerca de 300 portadores de deficiência visual em Sorocaba. O problema se impõe em todos os momentos em que é preciso realizar alguma compra, quando eles têm de diferenciar o valor das notas e moedas do Real e, ainda, confiar no troco repassado pelos comerciantes. A chamada “Segunda Família do Real”, cujas últimas notas foram lançadas no ano passado, poderia contribuir para a resolução deste problema, uma vez que cada cédula possui tamanho diferente. No entanto, a falta de capacitação dos deficientes para reconhecê-las, e as notas antigas, que ainda estão no mercado, impedem que isso ocorra.
A Associação Sorocabana de Atividades para Deficientes Visuais (Asac) estima que existam, apenas em Sorocaba, em torno de 300 pessoas portadoras de deficiência visual, sendo que 110 são atendidas pela entidade. São pessoas como Dalmira Rodrigues, Ilson Pinto de Camargo, Dézinho Cruz de Moraes e Sandro Gonçalves, que tiveram de recorrer a métodos próprios para fazer compras e pagar suas contas sem correr o risco de serem enganados.
Eles afirmam que nunca tiveram problemas no comércio local, mas conhecem quem passou por isso. “Aconteceu com uma colega minha, no Mercadão. Ela gastou R$ 10,00 e deu uma nota de R$ 10,00 para a pessoa cobrar e a pessoa insistiu que era outra nota que deveria ser dada, uma nota de R$ 20,00”, revela Dézinho. Segundo ele, “ela tinha certeza que era uma nota de R$ 10,00, insistiu muito, até passar uma pessoa pela porta, que ela chamou, e perguntou o valor da nota.” Ele afirma que “a pessoa confirmou que era uma nota de R$ 10,00 e, diante disso, ela devolveu a mercadoria, dizendo que não compraria mais.”
Para evitar ser enganado desta maneira, Sandro diz que desenvolveu um sistema próprio. “Levo o dinheiro contado, já certo para o que vou comprar. E quando a pessoa me dá o troco, eu peço para ela contar comigo e eu coloco na ordem, na sequência, porque no tato não dá para identificar as notas”, explica. “Eu coloco em ordem também”, conta Dézinho, que continua: “peço para a pessoa falar e tenho de confiar nele. Quando chego em casa, confiro com alguém e, se estiver errado, eu volto no outro dia para reclamar, mas nunca aconteceu.”
Por vezes, para fugir ao troco errado, alguns optam pelo cartão. “Se eu não for utilizar o dinheiro, uso o cartão; mas depende da compra eu uso mais o cartão, que é mais seguro”, conta Sandro. Ilson utiliza sistema semelhante. “Eu faço a mesma coisa, uso o mesmo sistema de dinheiro e também uso o cartão.”
Apesar de utilizar um sistema em que consigam controlar o próprio dinheiro, confiar ainda é necessário. “Tem que procurar comprar num lugar conhecido, procurar o vendedor que conhece, porque tem mais confiança”, revela Dalmira.
Cédulas
O Banco Central do Brasil terminou de lançar, em 2013, as últimas cédulas da “Segunda Família do Real”, que têm dimensões diferentes. De acordo com informações do site da instituição, as novas notas dificultam a falsificação, “além de promover a acessibilidade aos portadores de deficiência visual.” No entanto, os quatro afirmam que ainda é difícil distinguir as notas de Real por meio do tato, mesmo as cédulas tendo alto relevo. “As notas até tem alto relevo, mas é muito pequeno, tem de ter muito tato”, destaca Dézinho. “As notas de R$ 100 e de R$ 50,00 dá pra diferenciar porque são fininhas e mais compridas.”
Também é difícil fazer a distinção das cédulas por conta do tamanho, destaca a representante da Asac, Karen Previatti. “Eles só vão conseguir reconhecer quando tiverem uma referência. Então eles vão ter que ter uma de R$ 2,00 e uma de R$ 10,00, por exemplo, para saber qual é qual.” É o que eles atestam: “As novas notas ainda não resolveram nosso problema”. “Ainda prefiro confiar na ordem do dinheiro quando saio de casa”, completa Sandro.
Capacitação
Para que possam reconhecer a diferença entre as cédulas de dinheiro, seria preciso que os deficientes visuais passem por uma capacitação, destaca Karen. De acordo com ela, a associação ainda não tem condições de fazer isso com as cédulas, que seriam necessárias para atender a, pelo menos, 15 ou 20 alunos por turma.
Outro problema apontado por ela é que as notas antigas ainda estão no mercado. “Seria preciso retirar as notas antigas, para que eles possam se acostumar com as novas.”
Nova família
As informações sobre a nova família do Real podem ser obtidas no site do Banco Central do Brasil, www.bcb.gov.br. As novas cédulas são impressas em papel fiduciário, que tem uma textura mais firme e áspera que o papel comum. Confira as medidas de cada nota: Dois reais – 6,5 cm de altura e 12,1 cm de comprimento; Cinco reais – 6,5 cm de altura e 12,8 cm de comprimento; Dez reais – 6,5 cm de altura e 13,5 cm de comprimento; Vinte reais – 6,5 cm de altura e 14,2 cm de comprimento; Cinquenta reais – 7 cm de altura e 14,9 cm de comprimento; Cem reais – 7 cm de altura e 15,6 cm de comprimento.
Fonte: Cruzeiro do Sul