Perder uma perna em um acidente de trânsito é traumático e muda a vida de qualquer um. Mas, depois de conseguir voltar a andar e conquistar uma vida normal com o auxílio de uma prótese, ficar sem ela é como sofrer um novo acidente e perder outro membro. Pelo menos, é assim que o monitor de segurança Arcângelo Rocha Batista, de 32 anos, vem se sentindo nos últimos sete meses, período em que tenta se adaptar novamente às muletas, aposentadas há 12 anos.
É que, desde março, quando recebeu a última prótese ortopédica do Estado, o monitor está esperando que sejam corrigidas irregularidades no produto entregue a ele, que está em desacordo com as especificações recomendadas pelo médico e, também, definidas pelo edital de licitação lançado pelo Estado para a aquisição dos equipamentos.
Enquanto o problema não é resolvido, a prótese segue “encostada” em casa e o paciente precisa recorrer às muletas, o que, segundo ele, dificulta muito a locomoção. “É como se eu tivesse perdido minha perna pela segunda vez. Sem a prótese, não consigo fazer mais nada e me sinto limitado, fico deprimido. Esses meses foram muito difíceis”, relatou.
Arcângelo é usuário de prótese ortopédica na perna esquerda desde os 19 anos. A primeira ele recebeu do Governo do Estado dois anos depois de ter a perna amputada após se envolver em um acidente de trânsito, em 1998. De lá para cá, foram duas trocas de equipamento por solicitação do médico, todas sem contratempos.
Mas, em novembro de 2011, começaram a surgir problemas com a prótese. Diante do desgaste do equipamento que ele estava usando, o médico recomendou nova substituição, desta vez por um modelo mais moderno e durável. Segundo o monitor, o requerimento por uma nova prótese foi feito no dia 5 de novembro de 2011, mas a espera pelo equipamento durou 16 meses, só terminando no dia 19 de março de 2013.
“Esse mais de um ano que fiquei usando a prótese inadequada acarretou muitos problemas de saúde. Problemas de coluna, quadril, sofri muito com os inchaços e as dores pelo corpo. Não tinha mais condições de uso, estava me prejudicando, por isso hoje estou sem prótese nenhuma”, explicou.
Mas á chegada da prótese não deu fim aos problemas. Pelo contrário: no primeiro dia em que tentou usar o equipamento, percebeu que ele estava irregular e não se ajustava à coxa por um problema na válvula. Desde então, foram quatro visitas à manutenção, sem a correção do problema nem a entrega de uma nova prótese. “Procurei até o Ministério Público Estadual, que deu 60 dias para eles resolverem o problema, mas o prazo já venceu e até agora nada. E o pior é saber que pagamos por algo que não podemos usar, pois sai dos cofres públicos ”, reclamou.
Preço e qualidade diferentes do previsto
Não bastassem a demora para a entrega e a falta de manutenção do equipamento, os produtos usados na confecção da prótese ortopédica são diferentes – e mais baratos – do que foi especificado pela licitação realizada pelo Estado, resultando em um sobre preço de mais de 56%, denunciou Arcângelo.
De acordo com ele, as próteses licitadas pelo Estado deveriam ser confeccionadas em fibra de carbono, revestidas com termoline (material mais confortável, leve e duradouro) e com joelhos pneumáticos (com maior flexibilidade e durabilidade), mas a que foi entregue a ele é feita de plástico e fibra comum, com joelho impulsor, menos durável.
E as diferenças não se limitam à tecnologia usada no equipamento. Enquanto o Estado pagou R$ 16.332,00 em cada prótese, segundo consta no edital de licitação, o equipamento entregue a Arcângelo custou aproximadamente R$ 6 mil, segundo o paciente disse ter sido informado pelo próprio fornecedor do produto.
Secretaria garante solução
A Secretaria de Estado de Saúde (Susam) informou que o paciente Arcângelo Rocha Batista receberá uma nova prótese. O paciente também passará a fazer acompanhamento no Centro de Reabilitação da Policlínica Antonio Aleixo, da rede estadual de saúde. As medidas foram adotadas ontem, após reunião entre a equipe da Susam, um representante do fabricante da prótese e o paciente.
Já a Secretaria de Estado de Assistência Social (Seas), órgão ao qual Arcângelo recorreu após o acidente, informou que a competência pela solicitação e entrega das próteses e da Susam e que não há irregularidade na contratação de empresa terceirizada.
Fonte: A Critica