Há cerca de dois meses, sete alunos da Escola Estadual de Cegos Cyro Accioly, localizada no bairro do Centro, em Maceió, se preparam para mais uma edição do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), que será realizado nos dias 26 e 27 de outubro. Divididos em duas turmas, uma pela manhã e outra no horário da tarde, os alunos contam com seis professores facilitadores, profissionais especialmente capacitados para atender aos deficientes, três da própria escola e outros três disponibilizados pelo CAP (Centro de Apoio Pedagógico).
Através de aulas diárias e com o auxílio de recursos tecnológicos que facilitam a assimilação do conteúdo, o curso preparatório, ofertado desde 2009 pela escola, tem o objetivo de colocar os alunos para competir em condições de igualdade com os demais estudantes que participarão do Enem, como ressalta a coordenadora do Núcleo Didático Pedagógico do CAP, Eleusa Barros.
“O objetivo é proporcionar o mesmo conteúdo de uma escola regular, para que eles possam competir com alunos de qualquer instituição. Há também o sentido de inclusão, pois a entrada em uma universidade é uma oportunidade para que eles tenham uma melhoria na qualidade de vida”, destaca.
Geralmente iniciado ainda no primeiro semestre, o calendário de ensino deste ano sofreu um atraso devido às obras de reforma na escola. O plano de estudos, segundo Eleusa, teve que sofrer algumas adaptações em virtude do imprevisto.
“A gente sempre começa antes do meio do ano, mas com a reforma tivemos que apressar um pouco e fomos direto às questões das provas anteriores do Enem, além de trabalharmos com o Guia de Redação e estarmos dando uma atenção especial a essa matéria. Mesmo com a dificuldade, nós fizemos esse esforço para que eles não percam nada”, ressalta.
Caminhando para a sua segunda participação no Enem, o aluno Claudevan Firmino, de 31 anos, conta que, desta vez, está se sentindo bem mais preparado para o exame. “Ano passado eu fui com a cara e a coragem. Este ano estou com mais conteúdo e espero conseguir ingressar no curso de Educação Física, que sempre foi meu sonho”, conta.
Além do tempo, outro fator que vem dificultando o ensino este ano é o não funcionamento da única impressora em braile existente no prédio, equipamento considerado fundamental para a transmissão do conteúdo.
De acordo com o diretor interino do CAP, Roberto Leite, houve um princípio de incêndio na última vez que a impressora foi utilizada. “Esse problema ocorreu após a reforma, e a nossa suspeita é que o reparo da parte elétrica do prédio não tenha sido concluído”, afirma.
Para Leite, que também é deficiente visual, as dificuldades enfrentadas pelos alunos são ainda maiores dentro das instituições de ensino superior. Graduado em Letras pela Universidade Federal de Alagoas (Ufal), ele conta que precisou improvisar para conseguir acompanhar o ritmo das aulas. “Eu levava o meu gravador para as aulas e escutava quando chegava em casa, além de fazer as minhas anotações em braile. No caso dos textos longos, eu tinha que arranjar alguém para ler, já que não havia impressoras em braile. A gente sabe que existe a Lei da Acessibilidade, mas muito pouco é posto em prática dentro das universidades”, revela.
De acordo com a coordenadora do Curso Preparatório para o Enem, Márcia Villas Boas, o saldo da participação dos alunos nos exames anteriores é positivo. “Eles pontuam bem, são muito engajados. Claro que há uma dificuldade maior se formos comparar com os outros alunos, tanto é que eles têm uma hora a mais para fazer a prova, mas o resultado vem sendo bom”, comemora.
Para atender aos candidatos que declaram cegueira ou baixa visão, o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), responsável pela aplicação da prova, informou que vai disponibilizar versões da prova em braile ampliada (com fonte tamanho 18) ou super ampliada (fonte 24).
Os candidatos que solicitaram a prova em braile estarão em salas individuais e serão atendidos por duplas de ledores, pessoas capacitadas para ler textos e descrever imagens. No caso dos estudantes com baixa visão que farão provas ampliadas ou super ampliadas e solicitaram o ledor ou transcritor, a aplicação também será em sala individual. Os que não pediram o acompanhamento desses profissionais serão acomodados em turmas de no máximo 12 pessoas, segundo o Ministério da Educação (MEC).
O MEC também disponibiliza profissionais capacitados para transcrever as respostas de provas das objetivas e da redação. Os transcritores atuam em duplas, geralmente com o apoio de ledores. No total, segundo o Inep, 48.048 candidatos solicitaram atendimento diferenciado para fazer o Enem deste ano. Entre eles, 12.901 declararam alguma deficiência física. A cegueira foi apontada por 1.013 candidatos; outros 7.813 alegaram ter baixa visão e 30 disseram ser cegos e surdos.
Fonte: G1