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Pessoas com deficiência: problemas de qualificação e a falta de cumprimento de cotas travam acesso ao mercado de trabalho

O Brasil tem mais de 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência. Desse total, quase 13 milhões possuem deficiência severa, segundo o Censo de 2010 do IBGE. O número, porém, não se reflete no mercado de trabalho. Aproximadamente 325 mil, ou menos de 1% dos mais de 44 milhões de trabalhadores com vínculo empregatício, são deficientes.

Desde 1991, o Brasil conta com uma lei, conhecida como Lei de Cotas (artigo 93 da Loas), que obriga as empresas com mais de cem empregados a reservar de 2% a 5% das vagas para pessoas com deficiência. Apesar disso, o país ainda está longe de ser um exemplo. Os obstáculos no cumprimento da lei passam pelo preconceito e a má vontade dos empregadores, dificuldades da própria empresa em se adaptar à regra e à falta de qualificação dos profissionais interessados.

Possibilidade de mudanças

Na Câmara dos Deputados, tramitam diversas propostas de mudanças nas regras atuais de contratação de deficientes. Algumas delas ampliam o leque de empresas obrigadas a contratar esse tipo de funcionário, tornando a regra obrigatória para os negócios com 50 ou mais empregados, como o PL 1240/11, do deputado Walter Tosta (PSD-MG).

Outras, como o PL 1653/11, do deputado Laercio Oliveira (PR-SE), pretendem flexibilizar a contratação, com a justificativa de que alguns setores não conseguem trabalhadores capacitados para as tarefas ofertadas.

Embora haja dezenas de projetos de lei para tratar do tema — inclusive a proposta do Estatuto da Pessoa com Deficiência (PL 7699/06) —, a necessidade de mudanças não é consensual. Alguns parlamentares e especialistas reforçam que o mais importante é garantir o acesso de deficientes à educação.

Educação deveria ser prioridade

A sugestão da deputada Rosinha da Adefal (PTdoB-AL), ela própria cadeirante, para o cumprimento da norma é aumentar as penalidades para quem não cumpre a Lei de Cotas. Hoje, a penalidade é de multa, que varia entre R$ 1,3 mil e R$ 132,9 mil.

– A legislação é avançada e serve de exemplo para países economicamente mais desenvolvidos que o Brasil, mas infelizmente ainda não é efetiva porque falta uma penalidade maior para quem deixa de cumpri-la – afirma a deputada.

Com esse intuito, a deputada Érika Kokay (PT-DF) apresentou o Projeto de Lei 5059/13, que eleva o valor das multas para R$ 6 mil a R$ 780 mil.

Também para o procurador do Ministério Público do Trabalho Flávio Gondim, não há necessidade de modificar a atual legislação:

– Há outros aspectos que precisam ser mais bem trabalhados: a acessibilidade, o acesso à educação. Tudo isso é entrave. O problema vem muito antes do momento de a pessoa com deficiência ingressar no mercado de trabalho.

Salários são baixos

Para o desembargador Ricardo Tadeu, a Lei das Cotas é apenas o começo da inclusão, porque as vagas ofertadas ainda estão longe do ideal.

– O Brasil conta hoje com 325 mil trabalhadores com deficiência, o que o destaca no cenário internacional. Todavia, as vagas são vagas de baixa remuneração, que acabam por desestimular as pessoas a buscar o mercado de trabalho – explica.

Um dos fatores de desestímulo é justamente a baixa remuneração. Hoje, pela Lei de Assistência Social (8.742/93), o deficiente desempregado cuja renda familiar seja inferior a um quarto do salário mínimo tem direito a um salário mínimo de benefício, mesmo que nunca tenha contribuído para o INSS. Ao conseguir o emprego, o deficiente perde o benefício. Desse modo, muitos preferem continuar desempregados e recebendo o salário mínimo a receber uma vaga com igual remuneração.

APENAS 8% DAS EMPRESAS CUMPREM A LEI DE COTAS

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Seiti Kleffer considera-se um vencedor. Aos 23 anos, ele acaba de se formar em Serviço Social e já conseguiu o primeiro emprego. O que diferencia Seiti de outras pessoas é o fato de ser cego e surdo de um ouvido. Essas características, no entanto, nunca o impediram de ir à luta em busca de seus direitos e do crescimento profissional.

Seiti trabalha em uma universidade em Brasília, justamente no setor que busca incluir alunos com deficiência. A tarefa do jovem é digitalizar materiais para outros alunos que, como ele, não enxergam ou enxergam pouco. Faz parte da política da instituição incluir alunos e também contratar pessoas com deficiência para trabalhar no local.

Firmas precisam se adequar

As deficiências de cada pessoa são específicas, o que obriga a empresa a se adequar às necessidades de cada um. Um cego, por exemplo, sofre com a falta de programas de computadores específicos. Já o surdo precisa da ajuda de um intérprete da língua brasileira de sinais ou de legendas.

– Existe um trabalho bem específico para cego e um trabalho mais específico para surdo. O trabalho para cego envolve muito telemarketing. E trabalho para surdo eu não posso fazer, porque não consigo ver – explica Seiti.

No caso de quem utiliza cadeiras de rodas, as dificuldades começam ao sair de casa, como atesta a médica e professora Izabel Maior.

– Eu tenho que pensar muito aonde eu vou, antes. Eu preciso saber se o banheiro é acessível. Eu preciso saber quanto tempo eu vou demorar. Se eu vou ter que chamar um carro. Se eu estou com cadeira motorizada, eu tenho que chamar um táxi especial com muita antecedência – enumera.

Lei de Cotas não é cumprida

São poucos os deficientes que têm a sorte de Seiti e Izabel. O país conta, há 22 anos, com uma lei que obriga empresas com mais de cem empregados a contratar pessoas com deficiência. Pela regra, as empresas que têm entre cem e 200 funcionários devem reservar pelo menos 2% das vagas para profissionais com deficiência. Para empresas com até 500 funcionários, a cota sobe para 3%, com até mil, 4%, e acima de mil, a cota é de 5%.

Porém, o fato é que são poucas as empresas que cumprem a lei. De acordo com dados da Relação Anual de Informações Sociais, das mais de 45 mil empresas com cem ou mais empregados no Brasil, apenas 3.800 – pouco mais de 8% do total – cumpriam a cota mínima de contratação de pessoas com deficiência no fim de 2011.

Calcula-se que, se a lei de cotas fosse cumprida, pelo menos 900 mil trabalhadores com deficiência teriam um emprego, em um universo de 45 milhões de pessoas com algum tipo de deficiência.

Mil empresas multadas por ano

Auditores fiscais do Trabalho fiscalizam o cumprimento da medida em todo o país. A empresa infratora é punida com multa que varia de R$ 1,3 mil a quase R$ 133 mil, conforme o tamanho do negócio. Em média, mil empresas são autuadas a cada ano.

Segundo Fernanda Di Cavalcanti, coordenadora nacional do Projeto de Inserção de Pessoas com Deficiência no Mercado de Trabalho, a fiscalização tem levado muitas empresas a se enquadrar.

A falta de vontade de algumas empresas e o preconceito em admitir pessoas com deficiência não são os únicos entraves ao cumprimento da lei. Em muitos casos, o que há é dificuldade mesmo para se adaptar, como já havia destacado Seiti Kleffer e como afirma Janilton Fernandes Lima, da Confederação Nacional do Comércio:

– É preciso investir, de alguma forma, na adaptação. Às vezes é preciso alterar a estrutura física do local, mas o lojista, o comerciante não é o proprietário.

Em outros casos, o que faltam são profissionais com deficiência qualificados. De qualquer forma, cursos adaptados existem, como explica Adriana Barufaldi Bertoldi, especialista em Desenvolvimento Industrial do Senai. Segundo ela, o Senai adapta os currículos do curso de interesse da pessoa com deficiência e já incluiu 80 mil profissionais no mercado de trabalho entre 2007 e meados de 2013.

A maior dificuldade é fazer com que as pessoas tenham acesso a essa capacitação, mas quem se capacita surpreende: – A gente sempre subestima os deficientes. Eles só precisam que a gente garanta os apoios necessários.

(Com informações da Agência Câmara de Notícias)

 

Zero Hora